quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

DIVINO, UMA FIGURA





DIVINO EM SUA BICICLETARIA, 
AVENIDA WEIMAR GONÇALAVES
DOURADOS (MS)


Divino Cláudio da Luz, 61 anos, nascido em São Paulo, chegou para morar em Café Porã[1], no dia 02 de agosto de 1960, então uma criança. O seu pai chegando ao Café Porã, como não poderia deixar de ser, foi trabalhar com o cultivo do café[2], na condição de arrendatário.
Divino tendo ido morar em Café Porã, depois de algum tempo, acabou por conhecer praticamente todos os moradores do São Lourenço, especialmente, Epifânio Ribeiro. O relato feito por Divino, mesmo  não tendo sido morador de São Lourenço e nem trabalhado nas terras pertencentes à Família Ribeiro, foi incluído, amigo leitor, porque, o Sr. Sebastião Ferro (pai de Divino), morava há cerca de 300 metros da nascente do Córrego São Lourenço, logo permitirá a você compreender um pouco mais sobre este lugar e a sua gente.


Enio Ribeiro (eu), Córrego São Lourenço,
09/02/2020

 Este córrego é peça chave para a compreensão do processo de ocupação e do comportamento dos camponeses residentes em São Lourenço e adjacências.
Neste relato, o Divino que conta com uma memória fantástica, não se limitou a relacionar os fatos, fez questão de discriminar as datas em que os mesmos ocorreram.   Relatos que permitirão a você, leitor, compreender um pouco mais sobre São Lourenço, história que Divino a contou sem parar de trabalhar, andando de um lado a outro  em sua bicicletaria, concertando e atendendo simultaneamente, os seus clientes. Aliás, o Divino é uma pessoa inquieta, fala atropeladamente, ora rindo, ora ficando bem sério e declarou ser apaixonado pela profissão que escolheu, qual seja, mecânico de bicicletas. Pois bem, feitas estas considerações, descreverei o teor da narrativa feita a mim pelo Divino.
Sebastião Adelino da Luz (pai do Divino), conhecido popularmente como Sebastião Ferro, possuía uma bicicleta brasiliana, ano 1958, na qual, fez longas pedaladas em Café Porã, São Lourenço, Caarapã, Laguna, Nova América, Liberal, Pindaivão, Cerrito e a Aldeia Indígena Tatupiré. Nestes passeios - acrescentou Divino -, “o meu pai me levava, o que me permitiu conhecer os moradores desta região, dentre eles, os membros da Família Ribeiro”.
Divino revelou que além de pedalar, uma barbaridade pela região, o seu pai, em sua folclórica bicicleta brasiliana, era um exímio capador de porcos, habilidade que o fez muito conhecido, popular e muito solicitado pelos camponeses de Café Porã, São Lourenço e região. Aliás, Sebastião Ferro, ressaltou Divino, estava sempre pronto para castrar algum animal. Não cobrava por tais serviços, os realizava pelo prazer em demosntrar o quanto era habilidoso na castração de suínos.
Divino disse que existiu em Café Porã, uma aldeia indígena, denominada de Tatupiré, cujos indígenas transitavam frequentemente por toda a região. Que Sebastião Ferro, inúmeras vezes contratou a mão de obra indígena para trabalhar no desmatamento[3] das terras que arrendara para plantar café e  que o seu pai,  frequentemente, a semelhança dos demais camponeses que contratavam mão de obra indígena para a lida na lavoura,  oferecia cachaça para os indígenas trabalharem, já que, corria de boca em boca que, sob o efeito do álcool, estes eram mais produtivos. Os proprietários podiam deixar faltar alimentos, mas  aguardente [4], não podia faltar (risos).
Naquele período histórico, a caça era abundante na região, logo a alimentação para os trabalhadores indígenas não exigia muita preocupação. Estes eram exímios caçadores, se internavam nas matas e abatiam pacas, veados, perdizes, codornas, etc., logo não era preciso se preocupar com a alimentação dos mesmos.  Mas Sebastião Ferro, em alguns momentos, também recorreu a mão de obra paraguaia.
Sobre o Córrego São Lourenço, Divino relatou que por ter morado muito próximo de suas nascentes, muitas e muitas vezes foi até as mesmas brincar. Do Córrego São Lourenço afirmou que guarda saudosas lembranças, já que neste córrego, pescou, brincou, tomou banho, etc., viveu experiências extremamente marcantes em sua infância.
Sebastião Ferro morou em Café Porã até dia 22/09/1972, sendo que neste mesmo ano mudou-se com a família para Dourados. Sete dias depois, 29/09/72, Divino começou a trabalhar como empregado na Bicicletaria Universal[5], localizada na Avenida Marcelino Pires, na qual, trabalhou até 1985. Depois disso estabeleceu-se como proprietário de uma bicicletaria na Avenida Marcelino Pires e ainda, em 1985, para ser mais exato, 29/03/1985, instalou-se definitivamente com a mesma na Avenida Weimar Gonçalves Torres, endereço em que se encontra até hoje.
O Divino é uma figura folclórica, palmeirense apaixonado e zoador. Adora falar de esporte, política e religião. Aliás, um católico muito dedicado. Sobre estes três assuntos, quem se dispuser a ir até a sua bicicletaria, se tiver gás, poderá conversar o dia todo. É uma prosa sem fim. Aliás, o meu irmão o Paulinho, botafoguense doente, frequentemente vai até a bicicletaria do Divino, tendo ou não necessidade de consertar a sua bicicleta. E aí, imaginem a conversa que rola entre os dois.




[1] Café Porã, como o próprio nome sugere, era grande produtor de café e limita-se com o São Lourenço;
[2] Divino relatou que no período descrito, somando-se as plantações de todos os cafeicultores, em Café Porã, existiram 1.700.000 mil pés de café plantados.

[3] As derrubadas eram feitas costumeiramente de janeiro a junho, enfatizou Divino;
[4] Fornecer cachaça aos indígenas era e é proibido por lei. Os camponeses, porém, ignoravam tal legislação, de um lado porque não existia fiscalização rigorosa e também porque faltava sensibilidade aos camponeses de perceberem os trabalhadores indígenas como sendo seres humanos, portanto, iguais direitos aos trabalhadores não indígenas;
[5] Era a maior bicicletaria de Dourados. Esta bicicletaria não existe mais;



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