domingo, 15 de janeiro de 2023

O Protagonismo da Familia Ribeiro em São Lourenço

 Nesta postagem abordarei um pouco sobre a região de Dourados, nos anos 1950, década em que parte da Família Ribeiro se instalou em São Lourenço, atualmente Município de Caarapó, naquele período histórico, Caarapó era um Distrito de Dourados. 

Na referida década as atividades econômicas eram de natureza extrativista, destacando-se o extrativismo da erva mate, tendo como protagonista principal a Companhia Mate Larangeiras. Digo principal porque também existiam algumas dezenas de pessoas que extraiam a erva mate como autônomos; e os índios que, basicamente, praticavam o extrativismo animal e vegetal, porém, não com fins comerciais e sim para sobrevivência da comunidade.]

A expansão das fronteiras agrícolas para o Oeste Brasileiro  como uma política de Estado começou timidamente com a criação Colônia Agrícola Municipal de Dourados, Colônia que territorialmente se estendeu sobre o então distrito de Itaporã. Todavia a grande arrancada da expansão agrícola se deu com  Getúlio Vargas em 1943, quando criou a Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND). 

E dito isso lembro que Augusto Ribeiro, ainda no ano de 1953, veio conhecer a Colônia Agrícola Municipal de Itaporá. Aliás, aqui já estavam outros conterrâneos nordestino, dentre eles, Antônio Ferreira, irmão de Pulcina Ferreira e o Boaventura. Augusto Ribeiro voltou muito entusiasmado com o que viu em Itaporã. Retornou ao estado do Paraná, onde era comerciante e começou a vender as coisas e, mesmo não tendo vendido tudo, no ano de 1954 veio de mudança para Itaporã, onde adquiriu terra. Todavia, em Itaporã ficou cerca de 06 meses, haja vista que, em meados de 1954 se instalou em São Lourenço, onde comprou uma pequena fazenda.

Embora não fosse a intenção, em São Lourenço, esta Família,  protagonizou um processo que se caracterizou por:

a) a passagem da atividade extrativista para as atividades agrícolas, agricultura diga-se de passagem, de subsistência;

b) a Família Ribeiro liderar os demais camponeses na dura tarefa de desbravar o São Lourenço. E isto ocorreu, paradoxalmente, apesar de a Família Ribeiro não dominar tão bem as atividades agrícolas, até porque, a experiência  da mesma com as atividades agrícolas  ocorrera no Nordeste, mas com características muito diferentes das verificadas aqui no então Mato Grosso;

c) no ano de 1953, quando  veio a Itaporã, Augusto Ribeiro atuava como comerciante de tecidos e alguns de seus filhos estavam se lançando como alfaiates. Ou seja em São Lourenço os membros desta Família começaram aprender como lavrar a terra. O início não foi nada fácil, mais ainda assim, lograram êxito, sendo que José Ribeiro foi o que melhor compreendeu o que fazer e serviu de farol aos demais membros da Família (detalhe: esta é uma opinião minha, quem compreender a questão de forma diferente, eu respeito e não vou polemizar).

d) a Família Ribeiro  tomou a iniciativa de liderar o processo de buscar a autossuficiência não só para os Ribeiros, como também para os demais camponeses, relacionadas as seguintes serviços:  educação, religião, abastecimento popular, lazer e saúde. Isto explica porque a Escolinha Rural Mista de São Lourenço, o Centro Espírita Allan Kardec, o armazém ou bolicho, os campos de futebol se localizavam todos, sem exceção,  na Fazenda de Augusto Ribeiro. Os dirigentes e responsáveis pelo funcionamento desta estrutura, em alguns casos eram na sua totalidade, membros da Família Ribeiro, dentre elas a de professor, diretor,  responsáveis pela limpeza e secretaria da  Escolinha, todos membros da Família: Ildefonso Ribeiro e  Maria Sinhá; e quando o êxodo rural esvaziou quase que por completo o São Lourenço, Antônio Ribeiro da Silva Filho - o Toinho - foi professor desta escolinha; os dirigentes e médiuns do Centro Espírita Allan Kardec, grande parte era integrante da Família Ribeiro; o armazém era de propriedade da Augusto Ribeiro, e em boa medida, minimizou o drama do abastecimento popular em São Lourenço; os dirigentes e a maior parte dos atletas dos times de futebol em São Lourenço eram da Família Ribeiro; e a maioria dos digamos, agentes de saúde da Família Ribeiro: Maria Sinhá, parteira; Pulcina, uma espécie de curandeira que conhecia muito bem as propriedades terapêuticas das ervas medicinais, como prepará-las e ministrá-las; Ildefonso Ribeiro era aplicador de injeção e responsável por pequenas cirurgias (bernes, cirgurgias em crianças que nasciam com o sexto dedo): Ildefonso Ribeiro também cuidava da saúde do rebanho bovino: vacinas, partos e outros cuidados; além destas atividades, Ildefonso Ribeiro desempenhou papel de assistente social, lendo e escrevendo cartas para as famílias em que todos os membros eram analfabetos; alguns contratos eram datilografados por Ildefonso Ribeiro;

O curioso é que a Família Ribeiro exerceu este papel de liderança em São Lourenço relacionadas as diversas demandas, sem ocupar cargos no aparelho estatal: mandato de vereador, deputado, senador, prefeito, governador. Liderou este processo por conta da estágio intelectual de seus membros, e também, me arrisco dizer por conta da influência da filosofia espirita kardecista que é a de que diante das dificuldades, não cabe as pessoas a lamentação, mas sim ter atitudes; e também pelo compreensão da maioria dos seus membros de que se fossem esperar que a ação do Estado, seja no plano nacional, estadual ou municipal se fizesse sentir  em prol dos camponeses residentes em São Lourenço, nas áreas de saúde, educação, abastecimento popular, lazer e religião, certamente teriam perecido. Recorrendo a Geraldo Vandré, ouso dizer "Quem sabe faz a hora, não espera acontecer", exatamente isso que, acertadamente fez, a Família Ribeiro.

domingo, 8 de janeiro de 2023

VOCÊ SABE O QUE É UM FUSÍVEL?


Em 1973, o meu pai me matriculou no curso de Radiotécnico a distância, oferecido pelo Instituto Universal Brasileiro (IUB), similar aos cursos à distância atuais, porém, sob o formato impresso e não o virtual. Eram denominados de curso por correspondência e não à distância. Os fascículos ou módulos eram enviados pelo Correio. Lembrando que os Ribeiros pagavam uma Caixa Postal nos Correios, na qual, as correspondências de natureza diversas eram endereçadas aos membros da Família, isto porque moravam na Zona Rural.

O meu pai, pressentiu que o futuro dele e família seria nas cidades. Porém, o desafio era a qualificação dos filhos  para o mercado de trabalho. Aliás outros membros da Família (Eunice Daniel, Maria Senhora e creio que a Marlene) diante da impossibilidade de fazerem cursos presenciais recorreram ao velho e referenciado IUB e cursaram Eunice e Maria Senhora, Corte e Costura; A Eunice e a Marlene, se não estou enganado, cursaram madureza ginasial.

Aliás, as mulheres da Família Ribeiro é que tomaram a iniciativa de buscar alternativas a profissão de lavradoras e e, em sendo assim, apontaram para todos nós, isto é, também os homens da Família, outros horizontes.

Acho interessante relatar estes fatos porque, via de regra, as narrativas são machistas e a Família Ribeiro, apesar de intelectualmente (falo sob o aspecto formal, mesmo), se situar um grau acima da média, se tomadas como referência as demais famílias camponesas residentes em São Lourenço, as quais, boa parte era analfabeta, ainda assim, a Família Ribeiro era extremamente machista e conservadora.

Por outro lado, as políticas agrícolas adotadas pelo governo Getúlio Vargas, a partir da década de 1940,  de avanço das fronteiras agrícolas para o Centro Oeste Brasileiro, cujo marco foi a instalação da Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND);

Registro que, com a implantação da Ditadura Militar em 1964, estas políticas sofreram mudanças qualitativas, quais sejam, a partir dos anos 1970, uma vez os camponeses tendo desbravado a nova fronteira agrícola, e pressionado lógica da Revolução Verde, os militares, optaram por estimular as práticas agrícolas que eram tradicionais, isto é, feitas manualmente com uso da enxada, machado, foice, enxadão, utilizando cavalos e bois, sob a influência dos avanços das relações capitalistas pelo campo,  as ditas práticas agrícolas, progressivamente e rapidamente foram substituídas pela mecanização, a tecnificação (fertilizantes, defensivos agrícolas e outros) e a produção dos agricultores, vai rapidamente deixando de ser de subsistência e se torna comercial e orientada para  exportação; gradativamente deixa de ser policultora e tornou-se monocultora e viabilizadora do processo industrial em curso no Brasil, iniciado em sua segunda fase a partir do final da década 1950, com Juscelino Kubitschek.

Dito em outras palavras a agricultura tradicional estava condenada a fracassar, não por acaso, mas como um propósito das classes dominantes, vale dizer, das burguesias industriais e rural; e  em São Lourenço, a partir de 1970, o êxodo rural foi intenso e total. Obviamente as terras foram parar na mão da burguesia rural. E os camponeses, a maioria veio tentar a sorte em Dourados.

Pois bem, diante do contexto relatado e, que necessariamente e certamente, parte da Família discorda, não havendo condições de frequentar na época, o ginásio ou cursos profissionalizantes, a solucão encontrada foi a de fazer os cursos à distância ou como se dizia na época, por correspondência.

O meu pai, com muito sacrifício, pagava as mensalidades e sonhava que um dia eu fosse um radiotécnico. Confesso que o decepcionei, verdade seja dita, não era a minha praia. Esforços da parte do meu pai além de pagar o curso, se deram no sentido de praticar a profissão, por isso, ele conversou com a Tia Antônia para que eu viesse morar em sua casa e pudesse pois, estagiar ou praticar a profissão em um radiotécnica em Dourados. A Tia Antônia e o Tio Miguel Daniel, gentilmente concordaram. Todavia, confesso, não logrei êxito.

Voltei a morar em São Lourenço e fui estudar em 1975, a 6ª série ginasial, na Escola Estadual Frei João Damasceno, em Nova América pois, enquanto morei na casa da Tia Antônia, cursei a 5ª séria no Colégio Oswaldo Cruz (hoje este Colégio não existe mais);

Mas o meu pai não desistiu da ideia e em 1976, depois de conversar com o Zé Carlos Morais, primo que estava passeando em São Lourenço, revelou o seu desejo de me ver qualificado como radiotécnico e o Zé Carlos, se propôs a conversar com uns uruguaios que tinham uma radiotécnica de Campo Grande e eu, mais uma vez, fui praticar radiotécnica. Todavia, não levava jeito mesmo. A verdade é que seis meses depois desisti e fui trabalhar na Serralheria da Família Morais a Gradelar, onde fiquei até 1978 quando fui servir o exército. Me tornei um meio oficial em serralheria. Enfatizo que a Tia Maria e a Família Morais sempre me trataram muitíssimo bem. A Tia Maria, inclusive, me tratava, acredito,  até melhor que aos seus próprios filhos. Aliás não tenho o que reclamar tanto da Família Daniel, quanto da Família Morais.

Você sabe o que é um fusível?

Por eu estar cursando radiotécnica, o Tio Antônio sempre brincava comigo, dizendo: “Enio, você já sabe o que é um fusível?” Isso virou gozação entre os demais primos.

Concertei o rádio do Tio Celso

Os tios querendo me ajudar a se tornar um técnico, bem que deram uma mãozinha. Me lembro que o Tio Celso, tinha um rádio, marca Semp e o mesmo apresentou um defeito no seletor das faixas (ondas curtas e longas). A verdade é que eu troquei o seletor e se ficou bom não sei. O Tio Celso, nunca reclamou, talvez para não me desanimar.

 

 

 

 

 

Assim era o lavrador

Nos anos 1960, 1970 e 1980, quem exercia as atividades agrícolas era denominado de lavrador. Naquele período quase todas as atividades agríc...