domingo, 8 de janeiro de 2023

VOCÊ SABE O QUE É UM FUSÍVEL?


Em 1973, o meu pai me matriculou no curso de Radiotécnico a distância, oferecido pelo Instituto Universal Brasileiro (IUB), similar aos cursos à distância atuais, porém, sob o formato impresso e não o virtual. Eram denominados de curso por correspondência e não à distância. Os fascículos ou módulos eram enviados pelo Correio. Lembrando que os Ribeiros pagavam uma Caixa Postal nos Correios, na qual, as correspondências de natureza diversas eram endereçadas aos membros da Família, isto porque moravam na Zona Rural.

O meu pai, pressentiu que o futuro dele e família seria nas cidades. Porém, o desafio era a qualificação dos filhos  para o mercado de trabalho. Aliás outros membros da Família (Eunice Daniel, Maria Senhora e creio que a Marlene) diante da impossibilidade de fazerem cursos presenciais recorreram ao velho e referenciado IUB e cursaram Eunice e Maria Senhora, Corte e Costura; A Eunice e a Marlene, se não estou enganado, cursaram madureza ginasial.

Aliás, as mulheres da Família Ribeiro é que tomaram a iniciativa de buscar alternativas a profissão de lavradoras e e, em sendo assim, apontaram para todos nós, isto é, também os homens da Família, outros horizontes.

Acho interessante relatar estes fatos porque, via de regra, as narrativas são machistas e a Família Ribeiro, apesar de intelectualmente (falo sob o aspecto formal, mesmo), se situar um grau acima da média, se tomadas como referência as demais famílias camponesas residentes em São Lourenço, as quais, boa parte era analfabeta, ainda assim, a Família Ribeiro era extremamente machista e conservadora.

Por outro lado, as políticas agrícolas adotadas pelo governo Getúlio Vargas, a partir da década de 1940,  de avanço das fronteiras agrícolas para o Centro Oeste Brasileiro, cujo marco foi a instalação da Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND);

Registro que, com a implantação da Ditadura Militar em 1964, estas políticas sofreram mudanças qualitativas, quais sejam, a partir dos anos 1970, uma vez os camponeses tendo desbravado a nova fronteira agrícola, e pressionado lógica da Revolução Verde, os militares, optaram por estimular as práticas agrícolas que eram tradicionais, isto é, feitas manualmente com uso da enxada, machado, foice, enxadão, utilizando cavalos e bois, sob a influência dos avanços das relações capitalistas pelo campo,  as ditas práticas agrícolas, progressivamente e rapidamente foram substituídas pela mecanização, a tecnificação (fertilizantes, defensivos agrícolas e outros) e a produção dos agricultores, vai rapidamente deixando de ser de subsistência e se torna comercial e orientada para  exportação; gradativamente deixa de ser policultora e tornou-se monocultora e viabilizadora do processo industrial em curso no Brasil, iniciado em sua segunda fase a partir do final da década 1950, com Juscelino Kubitschek.

Dito em outras palavras a agricultura tradicional estava condenada a fracassar, não por acaso, mas como um propósito das classes dominantes, vale dizer, das burguesias industriais e rural; e  em São Lourenço, a partir de 1970, o êxodo rural foi intenso e total. Obviamente as terras foram parar na mão da burguesia rural. E os camponeses, a maioria veio tentar a sorte em Dourados.

Pois bem, diante do contexto relatado e, que necessariamente e certamente, parte da Família discorda, não havendo condições de frequentar na época, o ginásio ou cursos profissionalizantes, a solucão encontrada foi a de fazer os cursos à distância ou como se dizia na época, por correspondência.

O meu pai, com muito sacrifício, pagava as mensalidades e sonhava que um dia eu fosse um radiotécnico. Confesso que o decepcionei, verdade seja dita, não era a minha praia. Esforços da parte do meu pai além de pagar o curso, se deram no sentido de praticar a profissão, por isso, ele conversou com a Tia Antônia para que eu viesse morar em sua casa e pudesse pois, estagiar ou praticar a profissão em um radiotécnica em Dourados. A Tia Antônia e o Tio Miguel Daniel, gentilmente concordaram. Todavia, confesso, não logrei êxito.

Voltei a morar em São Lourenço e fui estudar em 1975, a 6ª série ginasial, na Escola Estadual Frei João Damasceno, em Nova América pois, enquanto morei na casa da Tia Antônia, cursei a 5ª séria no Colégio Oswaldo Cruz (hoje este Colégio não existe mais);

Mas o meu pai não desistiu da ideia e em 1976, depois de conversar com o Zé Carlos Morais, primo que estava passeando em São Lourenço, revelou o seu desejo de me ver qualificado como radiotécnico e o Zé Carlos, se propôs a conversar com uns uruguaios que tinham uma radiotécnica de Campo Grande e eu, mais uma vez, fui praticar radiotécnica. Todavia, não levava jeito mesmo. A verdade é que seis meses depois desisti e fui trabalhar na Serralheria da Família Morais a Gradelar, onde fiquei até 1978 quando fui servir o exército. Me tornei um meio oficial em serralheria. Enfatizo que a Tia Maria e a Família Morais sempre me trataram muitíssimo bem. A Tia Maria, inclusive, me tratava, acredito,  até melhor que aos seus próprios filhos. Aliás não tenho o que reclamar tanto da Família Daniel, quanto da Família Morais.

Você sabe o que é um fusível?

Por eu estar cursando radiotécnica, o Tio Antônio sempre brincava comigo, dizendo: “Enio, você já sabe o que é um fusível?” Isso virou gozação entre os demais primos.

Concertei o rádio do Tio Celso

Os tios querendo me ajudar a se tornar um técnico, bem que deram uma mãozinha. Me lembro que o Tio Celso, tinha um rádio, marca Semp e o mesmo apresentou um defeito no seletor das faixas (ondas curtas e longas). A verdade é que eu troquei o seletor e se ficou bom não sei. O Tio Celso, nunca reclamou, talvez para não me desanimar.

 

 

 

 

 

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