LOGOTIPO DO PCB
A convivência diária que tive com os tios José, Antônio, Celso e o meu pai, durante a minha infância, foi
determinante para que me tornasse um simpatizante e posteriormente, um militante do
Partido Comunista Brasileiro.
Mas a
contribuição deles não se deu apenas na forma de conversas. Tive o privilégio
de ler vários livros que pertenciam ao Tio José, com abordagens relacionadas a atuação
dos comunistas brasileiros. Dentre eles,
faço questão de mencionar, os Subterrâneos da Liberdade: obra publicada em três
volumes e escrita por Jorge Amado, o 1º volume com o título: Os Ásperos Tempos; o 2º volume: Agonia da noite; e o 3º volume: A luz no fim do túnel. Li os três volumes, quando ainda
criança e morava em São Lourenço, em meados da década de 1970.
Jorge Amado
(1912-2001) escreveu esta obra no início da década de 1950 e retratou um
período muito difícil e conturbado da História do Brasil, o denominado Período do Estado Novo (1937/1945), quando o País esteve submetido a uma ditadura fascista
liderada pelo então Presidente da República, Getúlio Vargas.
Getúlio Vargas,
segundo diversos historiadores, nutria grande simpatia pelo nazismo e chegou
cogitar uma aliança política e militar com a Alemanha, Japão e Itália durante a
2ª Guerra Mundial.
Quando escreveu esta obra, Jorge
Amado militava no Partido Comunista Brasileiro, e sendo um gênio como escritor, a sua narrativa é eletrizante e apaixonante.
Lendo-a, amigo leitor, em que pese todos os erros cometidos pelos comunistas na
luta que travaram contra o domínio imperialista visando impedir que o Brasil se
tornasse aliado ao regime nazista, sou forçado a reconhecer, Jorge Amado foi
muito feliz na forma como descreveu a ação dos comunistas neste processo.
Nela, Jorge Amado descreveu a
atividade clandestina do Partido Comunista nasgreves, manifestações
operárias e populares,etc, algumas delas, tristes, emocionantes e envolventes.
Por isso mesmo, permite-nos, amigo leitor, dimensionar o grau de perversidade
praticada pelas classes dominantes contra a sociedade brasileira e, mais
cruelmente, contra os comunistas. Os relatos das práticas (perseguições, prisões,
torturas, assassinatos e desaparecimentos) movidas pelos governantes
brasileiros, no período do Estado Novo, um regime ditatorial contra as forças democráticas e, especialmente
contra os comunistas, servem para demonstrar o quanto o Estado Novo foi
antidemocrático.
Amigo leitor, após a leitura de
Subterrâneos da Liberdade, a minha convicção de que as lutas políticas travadas
pelas massas populares no Brasil, neste período, sob as mais duras condições,
ainda que marcadas por erros táticos e muito romantismo político, são
merecedoras de nossa admiração, gratidão e aprovação. Convenci-me de que o
marxismo-leninismo, embora não tenha respostas para tudo, é inquestionavelmente o método que mais possibilita o
entendimento das razões das lutas emancipatórias dos diferentes povos e diferentes nações,
rumo sociedades livres da exploração do homem pelo próprio homem. No século
atual, o XXI, uma reinterpretação do marxismo está sendo empreendida, até
mesmo, porque outros aspectos se revelaram ao longo do tempo, tão relevantes,
tanto quanto a contradição entre Capital
x Trabalho. Estou me referindo a contradições várias que se manifestam de
forma mais desnudada, no modo de produção capitalista.
O Século XXI, se caracteriza pela
existência de diversos movimentos: ambientalistas, de igualdade de gênero,
pela paz mundial, indígena e GLBT., etc, os denominados movimentos identitários. Evidentemente, um grande esforço de
reinterpretação da contradição econômica, a luz da nova ordem econômica
mundial, está sendo feita no século XXI, cujo enfrentamento deve ser repensado
e contextualizado, coerente com a atual divisão internacional do trabalho, o
que implica em repensar o fazer dos marxistas sob um enfoque que não
superdimensione a contradição Capital x
Trabalho, até porque as demais contradições
– me refiro aos movimentos citados no início deste parágrafo - tem
importância capital na formação de estratégias e táticas a serem adotadas
visando à superação do modo de produção capitalista.
Coincidentemente
e lamentavelmente, a semelhança do verificado no período do Estado Novo
Brasileiro, o período em que tomei contato com as referidas obras, o Brasil,
mais uma vez, estava sob uma ditadura militar, cujo início se dera em 1964 e se
estendeu até 1985. A minha geração, portanto, foi educada a odiar o Partido
Comunista Brasileiro.
Todavia,
as informações e reflexões experienciadas por mim junto com os meus tios e o
meu pai, foram providenciais para que eu não assimilasse acriticamente os fatos e as
interpretações dadas aos mesmos pelos meios de comunicação (emissoras de rádio
e jornais) e instituições diversas: igrejas, escolas, partidos políticos, etc., até porque todos, sem exceçao, estavam sob censura.
Meu pai e meus tios José, Celso e Antônio Ribeiro, tinham como prática se informarem durante a vigência da ditadura militar compreendida (1964 a 1985),
através de emissoras de outros países;
Sabiam
que imprensa nacional estava sob censura. Que somente sintonizando emissoras
estrangeiras teriam acesso a programas jornalísticos que retratassem com muito
maior grau de independência o que estava acontecendo no Brasil. Estas emissoras
disponibilizavam, diariamente e em Português, de segunda a sexta feira,
programas de notícias para o Brasil e em português. Desta forma, apesar da censura imposta aos
meios de comunicação no Brasil, tive acesso, através destas emissoras estrangeiras,
a outras versões sobre o que estava ocorrendo no plano econômico e político no
Brasil. As Rádios Havana de Cuba, Central de Moscou, a Voz da América e BBC de
Londres, eram as emissoras que sintonizávamos, por volta das 19 horas, horário
de Brasília. Através destas emissoras foi possível avaliarmos o
que estava ocorrendo no Brasil e desta forma escapamos da manipulação das
informações feitas pelos meios de comunicação brasileiros.
Diante de um contexto político e econômico
tão macabro, compreendi que o Brasil estava sob um regime ditatorial, e porque
todos àqueles que se opunham ao mesmo, eram rotulados de terroristas. O regime
militar rotulando de terroristas todos os democratas, assim agia por entender
que ao desqualificá-los, personificando-os com a materialização de inimigos da
pátria, a sociedade não daria crédito aos que lutaram naquele período por
democracia e justiça social. Além de terroristas, os militares, não raro, os
rotularam de comunistas todos os que lutavam por justiça social e
democracia. Lembrando que para o povo brasileiro, em virtude do seu
analfabetismo político, um comunista era visto como uma pessoa que representava
um grande perigo para os valores morais e éticos da nossa sociedade.
Eu
mesmo tive uma experiência que comprova o que estou a dizer. Em 1975, estudava
em Nova América, na Escola Estadual Frei João Damasceno. Nesta Escola, certa
vez fui chamado à direção pelo diretor e pelos professores, porque estes
ficaram sabendo da minha identificação com o marxismo. A direção, a coordenação
e os professores fizeram suas falas, todos, sem exceção, objetivando me
convencer de que eu estava errado em nutrir alguma simpatia pelo socialismo e
pela ex-URSS.
Só não me aplicaram maiores punições porque quando
submetido aos questionamentos feitos pelos professores, fui dissimulado,
afirmando que a opinião que emitira favorável ao socialismo, a fiz sem saber com
propriedade o que estava falando. Desta forma fui liberado e as punições que
foram a mim aplicadas, se resumiram a perder o recreio e o sermão que ouvi. Acredito que o fato de eu ser um ótimo aluno, pesou a meu favor, de
sorte que, as punições mais severas e a convocação do meu pai para ir até a
Escola não ocorreram. Este fato me levou a compreender muito bem porque o meu
pai e os meus tios diziam que eu deveria ser cauteloso e que nem sempre deveria
emitir opiniões que fossem favoráveis ao socialismo.
O
constrangimento e o susto, contudo, não provocaram o meu desencanto com o
marxismo-leninismo, pelo contrário, aumentaram o meu interesse pelo programa do
Partido Comunista Brasileiro, e, sempre que podia, lia obras e mais obras que
tivessem como tema as lutas populares no Brasil e a atuação dos comunistas.
DA
CONDIÇÃO DE SIMPATIZANTE PARA A DE MILITANTE DO PCB
Mas eis que no dia 21 de Julho de 1981,
eu, o meu pai, o tio Antônio e o seu filho Augusto Ribeiro Neto fomos
convidados a participar da histórica reunião de criação do Partido Comunista
Brasileiro em Dourados. Para esta reunião fomos convidados por Gilberto
Carvalho,
Nela se fizeram presentes, sete pessoas.
A reunião foi finalizada com a criação da primeira célula comunista de
Dourados, denominada de base 21 de Julho.
O Gilberto nos convidou para esta reunião
dizendo que iríamos apenas assistir a uma simples reunião de Comunistas. Mas,
verdade seja dita, o Gilberto e o Luís Carlos Ribeiro·,
já foram com a intenção de sacramentarem a criação da primeira célula
comunista em Dourados. Tanto é que ao
final da reunião insistiram para que eu, o Tio Antônio, o Augusto e o meu pai
compuséssemos a direção desta célula. Da minha família, apenas eu fui o único a aceitar integrar a célula. O
meu pai, Tio Antônio e o Augusto se limitaram a serem simpatizantes.
Embora tenha aceitado, confesso, saí desta
reunião muito assustado. Verdade seja dita, desde os anos 1970, me identificava
com o marxismo, todavia, muito mais como um capricho de natureza acadêmica,
objetivando tão somente apropriar-me de uma retórica consistente a ser
utilizada nas rodinhas de conversas junto aos amigos,. jamais me imaginara sendo
um militante do PCB.
O certo é que fiquei três meses sem ir até
o escritório do Arquiteto, Luís Carlos Ribeiro, a Domus, na esperança de que
ele e os demais camaradas, o Guilherme Meldau Neto e Iara Ortiz
desistissem de me fazer um militante do PCB. No entanto, cerca de três meses
após esta reunião, o Luís Carlos apareceu na casa de meu pai e indagou porque
eu não tinha aparecido no seu
escritório. Depois desta cobrança, assumi pra valer o Partido.
A partir deste momento, passei
efetivamente a militar no PCB, militância que exerci de 1981 até 1986. Neste
curto espaço de tempo, em virtude de – modéstia à parte – nossa intervenção
qualificada, passamos a influenciar os diversos movimentos sociais e sindicatos
existentes em Dourados. Tornamo-nos uma referência. Sempre que se pensava na
organização de uma greve, de uma mobilização, etc., os dirigentes destes
movimentos, antes de adotarem qualquer encaminhamento, faziam questão de se
reunir conosco, os comunistas, para discutirem a melhor forma de o fazer De
muitos destes movimentos, nós os comunistas, nos tornamos dirigentes.
Quero ressaltar, o Tio José devida a sua
experiência, me monitorava, ainda que a distância, preocupado que estava de que eu pudesse ser tomado
de grande euforia e me expusesse demais, colocando em risco a minha própria
integridade física e a minha vida. Felizmente nunca fui preso, mas, no
campo profissional, reconheço que muitas portas se fecharam por conta de minhas
opções políticas.