quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

RENATO, O NEGOCIADOR

No São Lourenço,  na década de 1970, não existia rede de energia elétrica. Os equipamentos elétricos eram movidos a pilha: rádio, farolete e toca discos de pequena potência. Televisão, apenas na casa do Tio Dé, Tio Antônio e mais tarde na casa do Tio José. fazendo uso das baterias dos veículos, normalmente, tratores. Mas era muito regrado, só determinados programas, para não descarregar as baterias eram assistidos (novela, noticiário, um jogo importante, etc).
Sendo assim, tínhamos poucas  opções de lazer. Nos finais de semana, para os homens, havia o futebol. Para as mulheres, infelizmente, as opções de lazer praticamente não existiam.
Nós, os meninos(as) e os rapazes e moças, vez por outra, dávamos um jeito organizar o nosso próprio  lazer. Para os meninos: brincar de barata, de pé na lata, gurin-gurá, aprisionar vaga-lumes durante à noite; já os rapazes e moças, cujo lazer, era de outra natureza, às vezes, brincavam de passar anel: (uma pessoa era escolhida para passar o anel. O restante dos participantes pode ficar sentado um ao lado do outro com as mãos unidas, entreabertas, formando uma concha fechada. A pessoa que estiver com o anel entre as mãos deverá passar suas mãos entre as mãos dos outros participantes.Quando estavam envolvidos, nestas brincadeiras, rapazes, moças e adolescentes, se a pessoa que estivesse passando o anel, nas mãos de um menino ou menina e estivesse por ela interessado, este passava a mão nas mãos deste participante,  de forma a revelar, algo mais...);  cai no poço, (a brincadeira de cai no poço, era feita assim: a pessoa que teoricamente estava caída no poço, dizia: "cai no poço". E o restante dizia: "quem te acode". Então ela respondia: "meu bem que pode". Então o restante dos participanetes perguntava: "quem é teu bem?" Então, a pessoa dizia o nome de um menino ou uma menina e ia dar uma volta. Lembrando que estas brincadeiras eram a noite, o que permitia, aquele contato, aquela conversa mais significativa com o rapas ou a moça que porventura estivesse interessado. No entanto, a timidez, impedia que as coisas que um dois dois queria dizer, fossem ditas. Em outras palavras, muitos foram os que perderam a oportunidade de dizer o que gostariam de dizer (rsrs). No entanto,  alguns que...deixa prá lá.
Como se vê pela narrativas, algumas das brincadeiras estava a exigir a participação de homens e mulheres. E conseguir a participação feminina, eis o grande desafio. Não era  fácil, haja vista que precisava que os pais das meninas as liberassem para brincarem.
Alguém precisava se armar de coragem e conversar com os pais das garotas. Pois bem, o Renato, em 99% dos casos, era quem fazia a difícil conversa. O Renato tinha toda uma tática. Chegava na casa dos pais das meninas, muito eloquente, simpático, e, claro muita paciência, exercitando ao máximo a lábia, já que sem uma boa conversa, nada feito. A conversa era conduzida de forma a desarmar os pais, quebrando resistências, sendo assim, o Renato  muito perspicaz,  aguardava o momento certo para fazer o pedido  aos pais das meninas para liberá-las, e por incresça que  pareça, quase sempre dava certo.
Claro que havia toda uma recomendação dos pais para que respeitássemos as meninas, que não ficássemos até muito tarde, geralmente até às 21 hs. Desta forma fomos apreendendo a lidar com as pessoas do sexo oposto.E, em alguns casos, até namoros tiveram início nestas conversas.
Pois é, Manoel Renato, estou pensando aqui com os meus botões, não por acaso, você que  cursou direito, foi lá no São Lourenço que você iniciou o curso de advocacia, impulsionado pela necessidade do lazer e por você ter um espírito de ousadia. Graças a tua ousadia, em São Lourenço, em certos momentos, vencemos o tédio e nos divertimos. Obrigado por tudo. E cá, entre nós, sob certos aspectos, pinta um espírito nostálgico, pois eram brincadeiras sadias e, até certo ponto, ingênuas, mas extremamente relevantes para a nossa convivência naquela coletividade que era rural, e extremamente, conservadora. Moral da história, você se revelou um excelente negociador. Cá entre nós, o Tio José o inspirou. Digo isso porque o Tio era um gênio para dialogar.

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