quinta-feira, 29 de abril de 2021

ASSIM ERA EPIFÂNIO RIBEIRO

 O relato que estou fazendo aqui, embora não tenha colocado a mão sobre a bíblia e  feito o juramento de falar só a verdade, é a mais cristalina verdade sobre o comportamento de meu pai que, de resto acredito, tenha sido o adotado pelos demais tios: José, Antônio, Celso, Ildefonso, Epifânio e Antônia Ribeiro.

Meu pai quando mudou para a Cidade de Dourados, em alguns momentos fez compras na forma de crediário. Todavia, um  dia ou mais, antes do vencimento da fatura, ia até a Loja efetuar o pagamento da mesma por entender que receber o cobrador em casa era desonroso, ainda que fosse uma regra estabelecida pelos comerciantes. Pegava a sua velha Bicicleta Monark de Guerra e ia quitar a dívida., não importava se estivesse fazendo calor, frio ou chovendo.

Também se ficasse devendo para alguém, ainda que fosse centavos, fazia questão de retornar e efetuar o pagamento, mesmo que para isso tivesse que atravessar a cidade para encontrar o credor. Era radical em seus hábitos, é verdade, mas graça a este comportamento ético e de honestidade, não tenho que baixar a cabeça, onde quer que eu vá, graças a  esta postura de lisura de Epifânio Ribeiro. Por isso e muito mais, eu digo: tenho orgulho de ser filho de Epifânio Ribeiro

domingo, 25 de abril de 2021

AS PRÁTICAS DE CONSUMO EM SÃO LOURENÇO

Até a década 1970, quando a maior parte da população brasileira e em Dourados e Região, estava no campo; quando o Brasil não era ainda uma sociedade de consumo; quando os produtos eram, via de regra, fabricados para durarem muito tempo, muitos deles,  por décadas; quando não havia felizmente, a indústria que estimulava a produção descartável; quando, inclusive, o camponês não comprava os produtos que necessitava, quase sempre, ele mesmo os fabricava, alguém que quebrasse um copo, uma xícara ou outro objeto qualquer,  ouvia um  senhor sermão (bronca).

Diferente dos dias atuais em que, a indústria já fabrica os produtos para durarem menos tempo e não terem conserto. Uma televisão, computador ou um produto qualquer, atualmente, quando apresentam defeitos, não compensa consertá-los. Sai muito mais barato comprar outro, claro que ambientalmente falando, "o barato sai caro", já que, a retirada dos recursos naturais se dá em ritmo mais intenso e este modelo econômico é insustentável.

Em São Lourenço, algumas surras, os filhos de inúmeras famílias levaram por conta de danos provocados aos raros equipamentos comprados pelos país. Naqueles tempos, o camponês fazia a sua cama, em verdade, muitos deles,o faziam tarimbas; fazia bancos rústicos; copos e xícaras eram feitos com os recipientes de extrato de tomate ou litros de óleo comestíve, depois de consumidos os respectivos conteúdos. Para tanto, era muito comum as famílias terem um pé de ferro, comprar arrebite para colocar asas nestas latinhas e transformá-las em xícaras e canecas. Havia camponês na região de Dourados, que fazia estes utensílios e os vendia em Dourados, em frente ao Bar Douradense e o Bar Tókio por exemplo. Nestes locais onde  os camponeses tomavam o ônibus  ou  caronas pra voltarem para suas casas, era o local adequado para comercializar estes utensílios; as roupas, as camponesas, as faziam. Aliás, o camponês quanto era agraciado com boas colheitas, vinha até a cidade comprava  pano ou tecido de grandes dimensões (grandes peças de tecidos- denominada pelos camponeses, de fazenda). 

Uma vez comprado os tecidos,  uma camponesa costureira  se encarregava de fazer camisas,calções e vestidos. Um dos problemas era que normalmente as pessoas possuíam roupas feitas com o mesmo tecido, mesma estampa, a única variação que podia ser feita, era quanto ao modelo da roupa, em verdade, havia uma uniformidade no vestuário dos camponeses.

Me lembro que o meu Pai e o Tio Dé, em algum momento - diga-se de passagem, raros, já que tinham rendimentos baixos - vinham a Dourados e compravam estas ditas fazendas para presentear alguns sobrinhos ou sobrinhas. Acho que os demais tios devem ter feito isso também, todavia, não me recordo. 

quinta-feira, 22 de abril de 2021

O PAPEL HERÓICO DAS MULHERES, EM SÃO LOURENÇIO NA BUSCA DA AUTOSSSUFICIÊNCIA

Queridos parentes, os relatos que temos feito até aqui sobre a estada de parte da Família Ribeiro, em São Lourenço, reproduz em boa medida, muito machismo, ou seja, ao lê-los, podemos ter a impressão de que apenas os homens realizaram feitos notáveis, por conseguinte,  heróicos. Ledo engano.  Normalmente citamos os nomes de Ildefonso, Epifânio, Antônio, José, Celso, Augusto e outros. Mas para sermos justos devemos fazer referência a inúmeras camponesas benfeitoras daquela comunidade. Eis algumas delas: Maria Sinhá,Eunice, Maria Senhora. Purcina Ferreira, Dona Joana, Dona Amélia, Dona Filisbina, dentre outras.

Como uma espécie de autopenitencia, achei por bem relatar um pouco na presente narrativa, grandes feitos das camponesas em São Lourenço, algumas,  pertencentes a Família Ribeiro e as demais, integrantes das demais famílias sertanejas residentes em São Lourenço.

A busca pela autossuficiência em São Lourenço nas décadas de 1950, 1960 e 1970 se constituiu em um grande desafio para os sertanejos. É sabido que, primeiramente a Prefeitura de Dourados e num segundo momento a Prefeitura de Caarapó, não disponibilizavam os serviços demandados nos setores de saúde pública, assistência social, lazer, educação e abastecimento popular.

Por conta disso, os camponeses e camponesas em São Lourenço adotaram como estratégia a auto-organização visando atingir a autossuficiência na oferta destes serviços. A seguir farei alguns relatos que evidenciam o que estou a dizer:

Corte, costura e confecção de roupas

Nas décadas de 1950,l960 e 1970, o Brasil não era ainda uma sociedade de consumo, os produtos industrializados, ou não, eram disponibilizados e quando o eram, se caracterizavam por uma oferta muito aquém da procura e por isso mesmo, caríssimos. Dito em outras palavras comercializados a preços proibitivos para a renda dos camponeses. .

Em sendo assim, a solução encontrada em São Lourenço, foi a de, os próprios camponeses ou camponesas fazerem as suas roupas. Ou melhor dizendo, alguns e algumas camponesas, haja vista que, nem todas tinham habilidade para tais proezas. No caso das camponesas pertencentes a Família Ribeiro, merecem destaque a Eunice Daniel e Maria Senhora.  As duas fizeram o curso de corte e costura, a Eunice, por correspondência e pelo Instituto Universal Brasileiro  e Maria Senhora, penso que também.   

As duas, costureiras excelentes. Maria Senhora, a partir dos anos 1980, quando veio morar em Dourados, trabalhou em casas de confecções de roupas muito conceituadas junto a elite douradense. 

No São Lourenço, as noivas e os noivos recorriam aos serviços  da Eunice ou da Maria Senhora para confeccionarem as suas roupas para a cerimônia de seus casamentos. Se não foram felizes no matrimônio, posso afiançar, a culpa não foi destas excelentes costureiras. Pra dizer pouco, elas foram e são verdadeiras artistas no mundo do corte, costura e da confecção.

No entanto, claro que como menos brilho e excelência, outras camponesas fizeram toda a diferença em São Lourenço, costurando e recuperando  roupas, dentre elas, Pulcina Ferreira, a matriarca da Família Ribeiro, a Lurdes Gabriel, acreditem, todas, sem exceção, davam boas "cassetadas" ou melhor dizendo, faziam calças, camisas, calções, ceroulas, remendavam e desta forma não deixavam a "peteca" cair;

 Solange  e Maria Senhora. Maria Senhora,
uma costureira talentosa



As primas, Marlene e Eunice, cumplicidade e 

ousadia  rumo ao sonho de estudarem e se 

qualificarem para trabalhar em outras 

atividades não relacionadas a lavoura.

Foram bem sucedidas e abriram

a porteira para as demais primas e primos.


Parteiras:

Nas décadas citadas, não havia o Sistema Único de Saúde, portanto, só tinham acesso aos serviços de saúde nos postos de saúde e hospitais, as pessoas que trabalhavam com carteira assinada, por conta de convênio com o Instituto da Previdência Social. Realidade na qual,  não se enquadravam os camponeses residentes em São Lourenço, 

Sendo assim, especialmente, os partos eram feitos em casa e as camponesas eram assistidas pelas tão faladas e abençoadas parteiras. Cito aqui algumas delas: Maria Sinhá, Dona Joana, Dona Amélia, Dona Filisbina, dentre outras. Estas mulheres, verdadeiros anjos ou anjas (como queiram), estão a merecer um reconhecimento maior por conta dos heroicos serviços prestados aquela comunidade. 


Temos ai, Maria Sinhá, ao lado seu esposo, José
Ribeiro. Maria Sinhá,  professora, parteira e de
personalidade muito forte

Normalmente após, o parto, elas tornavam-se comadres dos casais que assistiram. Eram consideradas a partir do momento que assistiam o Parto, integrantes da família. Algumas cobravam pelos honorários, todavia, uma pechincha. Prestavam este serviço muito mais por amor, por caridade e solidariedade do que por dinheiro. Sendo assim verdadeiras heroínas e dignas de nossa nossa consideração e gratidão.

Curandeiras e benzedeira

As enfermidades que vitimavam os camponeses e camponesas em São Lourenço: sarampo, caxumba, catapora, verminose, mau de sétimo dia e outras, eram curadas recorrendo-se as benzedeiras, curandeiras, dentre elas: Purcina Ferreira, Dona Joana. Elas sabiam como deveria se dar o ritual, quais as ervas mais adequadas para a cura de cada doença; sabiam como preparar as ervas; e sabiam a dosagem que deveriam ministrar dos remédios feitos a partir de tais ervas. Graças a elas, eu por exemplo, sou um dos que estou aqui fazendo este relato. De resto, as demais camponesas também detinham um bom conhecimento sobre a propriedade terapêutica de diferentes ervas, tais como: sabugueira, vassourinha, erva de santa maria, babosa, erva cidreira e outras. E desta forma compuseram a legião de benfeitoras da saúde pública em São Lourenço;

Pulcina Ferreira, a Matriarca da Família Ribeiro
curava as pessoas no plano espiritual (oração e 
água fluida) e físico, graças aos seus 
conhecimentos sobre as propriedades das ervas que 
 cultivava, um herbário bastante
diversificado.

Mas além deste trabalho de suporte aos camponeses, não se enganem, as camponesas, a maioria, quase 100% deram um duro danado ao lado de maridos e filhos, lavrando a terra e cuidando de animais como galinhas, porcos e gado bovino.


quarta-feira, 21 de abril de 2021

ILDEFONSO RIBEIRO, DE TUDO UM POUCO

 

Foto publicado pelo Jornal Virtual DouradosNews, 
19 de Agosto de 2019, anexo a notícia publicada com 
o título: 
"Poeta é homenageado com Prêmio ‘Ildefonso Ribeiro da Silva"


Ildefonso Ribeiro da Silva, professor, poeta, escritor, fundador da Academia Douradense de Letras, da qual, também foi presidente, liderança do movimento espírita, dia 21 de Abril de 2008 veio a óbito.

Quero aproveitar esta data para homenageá-lo.  Filho caçula do casal, Augusto Ribeiro e Pulcina Ferreira, e que, segundo, os irmãos mais velhos, foi o mais paparicado. Até aí, nada de mais. Os pais, via de regra, se mostram mais carrascos com os filhos mais velhos, por conta da inexperiência, por serem mais jovens, logo menos tolerantes e por conta  das preocupações com a sobrevivência, normalmente, mais angustiantes nos primeiro anos de matrimônio. Desta forma, os filhos que cometem o “deslize” de nascerem primeiro, pagam um preço mais alto no que diz respeito a criação e quanto aos rigores (repressão e autoritarismo) na educação a eles  dispensadas pelos pais.

Ildefonso Ribeiro, tendo chegado ao São Lourenço, ainda muito jovem, em torno de 20 anos, em 1954, enquanto o restante da família (pai e irmãos) dedicou-se ao ato de lavrar a terra, a ele coube dedicar-se a atividade meio, quais sejam, ser professor e uma espécie de assistente social, papel que assumiu, não porque houvesse planejado, mas em virtude de que, naquele período histórico, o  São Lourenço era um sertão, logo com as habilidades e  os conhecimentos reunidos por Ildefonso Ribeiro, os seus serviços se revelaram relevantes para as  atividades meio e não atividades fins, ou seja, aquelas que viabilizariam, pelo em parte, as condições  para que o restante da família e demais camponeses residentes em São Lourenço, pudessem lavrar a terra com um pouco mais de tranquilidade. Naturalmente, a precariedade, pra não dizer a inexistência do oferecimento destes serviços pela Prefeitura, primeiramente de Dourados, haja vista que até 1958, Caarapó era um distrito de Dourados e depois pela Prefeitura de Caarapó, a solução encontrada em São Lourenço foi que alguém ficasse encarregado de: alfabetização das crianças e jovens; fazer o papel de assistente social: ler e escrever cartas para os camponeses - exceção feita, aos membros da família Ribeiro -, os demais camponeses cujas famílias  todos os seus membros eram analfabetos; coube a Ildefonso Ribeiro datilografrar documentos diversos, contratos de aluguel, arrendamento, lavrar atas, etc; até porque era datilógrafo e porque uma máquina de escrever;  fez também o papel de agente de saúde: aplicava injeções (naquele tempo, era recorrente o uso de injeções), fazia cirurgias, tais como,  extração de bernes relativamente grandes, de crianças recém-nascidas com o sexto dedo em uma das mãos ou dos pés, algo que naquele tempo ocorria com relativa frequência; além disso tinha permanentemente um estoque de soro antiofídico, já que em São Lourenço existiam muitas cobras venenosas e o socorro mais perto era Nova América. Atuando, como assistente social e agente de saúde, Ildefonso Ribeiro minimizou o sofrimento e em alguns momentos salvou a vida de muitos camponeses,  já que teriam Nova América, um distrito de Caarapó, onde existia um farmacêutico,  distava 13 km de São Lourenço; da Escola Rural Mista de São Lourenço, Ildefonso Ribeiro, além de professor era o responsável por cuidar dos documentos escolares (matrículas, notas e transferências dos alunos). Desta Escola era diretor, secretário, tarefas que em alguns momentos, as dividiu com a sua cunhada e também professora, Maria Sinhá. A Escola em São Lourenço era multisseriada, o professor ministrava, concomitante aulas para turmas em etapas diferentes. Eis a razão de o seu nome ser:  Escola Rural Mista de São Lourenço pois, naquele período não se utilizava o termo multisseriada e sim  mista; também era dirigente da Sociedade Espírita Allan Kardec( popular Centro Espírita), do qual ficou responsável, além das atividades propriamente ditas específicas do espiritismo kardecista, atuar como médium, dirigir reuniões, sessões na casa, formações da mocidade, pré-mocidade e mocidade espírita de São Lourençol, teve que  assumir também os compromissos burocráticos da sociedade: atas, publicação de documentos de utilidade pública, tesouraria e outros; era jogador e dirigente das equipes  de futebol de adultos que existiram em São Lourenço;  nos períodos eleitorais, a justiça eleitoral, o requisitava para ser mesário no Distrito de Nova América; e era responsável pelo ordenamento e cuidar das vacas (vacinar, machucados, picadas de cobras, etc).

Como se pode ver com esta narrativa, Ildefonso Ribeiro, embora não trabalhasse lavrando a terra, ou puxando o rabo da capeta (terminologia, utilizada pelo primo, Edmilson, quando se referia ao uso da enxada nas capinagens), também trabalhou duro e se constituiu no suporte para que a família e demais camponeses pudessem lavrar a terra no São Lourenço 

Em síntese, recorrendo a uma frase do querido e grande primo, o Manoel Renato, Ildefonso Ribeiro foi uma espécie de bombril, ou seja, "MIL E UMA UTILIDADES"

Ildefonso Ribeiro, Maria Senhora e os seus filhos, Ilton e Solange. 

O Marcelo, o seu filho caçula, não aparece nesta foto.

Assim era o lavrador

Nos anos 1960, 1970 e 1980, quem exercia as atividades agrícolas era denominado de lavrador. Naquele período quase todas as atividades agríc...